Regularidade imobiliária e modelagem contratual em projetos de geração de energia
Por Luis Felipe Dalmedico Silveira,
Maria Vitória Resende Alves e Larissa Kainy de Oliveira
O setor de geração de energia no Brasil vive um momento de intensa expansão, impulsionado por incentivos regulatórios, inovação tecnológica e crescente demanda por fontes alternativas e sustentáveis. A despeito das particularidades de cada projeto, todos compartilham o mesmo elemento essencial: a necessidade de imóveis aptos, tanto do ponto de vista físico, quanto jurídico, para instalação das estruturas e operação da geração, bem como a aplicação de uma modelagem jurídica eficiente, que permita a melhor distribuição possível do valor gerado pelo projeto entre as partes envolvidas.
A regularidade fundiária do imóvel onde se pretende implantar o projeto é um dos primeiros e mais relevantes aspectos a serem analisados. Isso inclui a verificação da titularidade da área escolhida, a existência e regularidade dos registros em cartório, possíveis sobreposições com imóveis vizinhos, áreas de preservação ambiental ou terras públicas, além de pendências envolvendo possíveis ações judiciais não finalizadas (ações possessórias, inventários ou litígios entre coproprietários, entre outras). A ausência de clareza sobre esses pontos pode inviabilizar empreendimentos, afastar investidores e até impedir o registro de garantias exigidas por financiadores, por exemplo.
Neste contexto, a auditoria legal imobiliária – etapa fundamental na viabilização de um empreendimento desse porte – torna-se imprescindível. Seu objetivo é oferecer um diagnóstico completo da situação dominial e registral do imóvel, identificando riscos e propondo soluções jurídicas para sua mitigação.
Além disso, à medida que o mercado de carbono e os critérios ESG ganham relevância, cresce o interesse por imóveis ambientalmente responsáveis e juridicamente regularizados. Um imóvel que abriga um projeto energético limpo — e que, juridicamente, está pronto para essa destinação — passa a ter maior valor estratégico e pode gerar oportunidades complementares, como créditos de carbono, certificações sustentáveis, CRIs (Certificado de Recebíveis Imobiliários), entre outros. Para o investidor, isso significa atratividade de mercado e acesso a financiamentos com condições diferenciadas, até mesmo incentivos fiscais.
Superada a fase de diagnóstico fundiário, é preciso estruturar juridicamente a relação entre o proprietário do imóvel e o empreendedor do projeto, o que varia conforme o tipo de energia envolvido, o porte da planta e o modelo de remuneração pactuado.
Projetos de usinas solares (“fazendas solares”) em áreas rurais, desenvolvimento de projetos de carbono florestal para geração de créditos de carbono, parques eólicos em regiões de planalto, empreendimentos urbanos de geração distribuída e instalação de placas solares em condomínios são alguns exemplos que exigem atenção à escolha do instrumento contratual adequado.
As principais formas jurídicas utilizadas para viabilizar a alocação de imóveis para projetos dessa natureza incluem a aquisição parcial ou total da área, arrendamento, parceria, locação, cessão onerosa de uso, direito de superfície, servidão, entre outros. Cada uma dessas formas traz vantagens e limitações conforme o contexto do projeto.
Independentemente da estrutura adotada, é preciso atenção a aspectos relacionados à delimitação exata da área cedida, prazos, condições de acesso, responsabilidade por licenciamento e regras para eventual desmobilização da estrutura ao fim da operação. A formalização desses instrumentos é etapa indispensável para garantir a segurança e a eficácia perante terceiros.
Projetos de geração de energia mobilizam investimentos relevantes e, obviamente, geram externalidades positivas para toda a sociedade. Os ganhos proporcionados por projetos dessa natureza dependem, portanto, da certificação da regularidade fundiária e da escolha da melhor modelagem jurídica para o empreendimento. Negligenciar esses fatores coloca em risco não somente a viabilidade econômico-financeira do projeto, mas também os ganhos econômicos, ambientais e sociais que o empreendimento poderia proporcionar a toda coletividade.
*Luis Felipe Dalmedico Silveira
é sócio da área contratual do escritório Finocchio & Ustra Sociedade de Advogados.
*Maria Vitória Resende Alves de Queiroz Telles
é coordenadora da área imobiliária do escritório Finocchio & Ustra Sociedade de Advogados.
*Larissa Kainy de Oliveira
é advogada da área contratual imobiliária do escritório Finocchio & Ustra Sociedade de Advogados.
Leia também: Multiplataforma é estratégia na jornada de venda do imóvel
Publicar comentário